Peter Zumthor é um arquitecto de referência. Todo o seu trabalho evidência é uma alternativa à arquitectura internacional contemporânea corrente. A sua vinda a Portugal foi uma rara oportunidade de ouvir e ver, pela própria pessoa, o seu processo criativo. Pessoalmente, não conhecia de todo a dimensão que este arquitecto tem à escala global. Uma maneira de o conhecer mais aprofundadamente foi mesmo visitar a WARM-UP EXPERIMENTADESIGN LISBOA 2009. A Exposição de Peter Zumthor na Lx Factory em Lisboa, iria abrir os nossos horizontes, assim como dar-nos a conhecer melhor o trabalho deste arquitecto.
Na Lx Factory, em Alcântara, foi montada uma exposição com uma amostra de edifícios e projectos de 1986 a 2007, sob a forma de maquetas e desenhos. A escolha do local da exposição não deve ter sido ao acaso. A Lx Factory situa-se num armazém esquecido de Lisboa, onde dá para se tactear a materialidade dos espaços. Assim como nos projectos de Zumthor, a exposição está liberta da arrogância dissimulada e da grandiosidade da arquitectura representacional contemporânea.
Lx FactoryEm toda a amostra apresentada na exposição revemos a simplicidade marcante da obra de Zumthor. A mesma divide-se em 3 momentos: um espaço para maquetas de grande escala, um espaço de instalações de vídeo (ambas rés-do-chão) e um espaço para esquiços, plantas e maquetas (no terceiro piso).
Layout da exposição, fonte: panfleto da Lx Factory
No primeiro espaço vemos as maquetas de grande escala de cinco trabalhos: a Topografia do Terror, a Swiss Sound Box, o Kunsthaus Bregenz, o museu Kolumba e Paisagem Poética. As três últimas maquetas merecem algum destaque: o Kunsthaus Bregenz, o museu Kolumba e Paisagem Poética.
A maqueta do Kunsthaus Bregenz mostra o detalhe construtivo até ao ínfimo pormenor. Ao representar um pormenor construtivo, identifica com exactidão o funcionamento do vidro fosco disposto na fachada. Este refracta a luz horizontalmente que embate no tecto de vidro.
A maqueta do museu Kolumba também me chamou atenção, quer pela sua dimensão, quer pelo modo como foi elaborada. Esta maqueta foi um estudo do efeito da luz no espaço. A maqueta foi feita para se entrar por baixo, para podermos ver o efeito da luz no seu interior. Como já conhecia o projecto, o efeito da luz vivido na maqueta é exactamente o mesmo que no museu. O próprio material utilizado corresponde ao da obra física. Embora nos sintamos enclausurados dentro dela, podemos ter a perfeita noção da escala humana. Mais uma vez, é visível o aprumo de Zumthor, a complexidade arquitectónica está presente no seu todo e é perfeitamente visível o impacto da antiga igreja Kolumba no espaço do museu.
A maqueta da Paisagem Poética pareceu-me interessante porque relaciona com o conceito de conforto e brutalidade. Relacionei-a logo com o Workshop de Jacinto Rodrigues, onde um dos exercícios foi criar uma peça que tanto transmitisse conforto e brutalidade. Basicamente esta peça aglutina os dois conceitos, a sua forma invaginada revela conforto – abrigo – e a sobreposição de cubos de madeira em vermelho extravia brutalidade. Até mesmo os cubos me fizeram lembrar, por momentos, a minha maqueta de estudo do Cadavre Exquis.
Num segundo momento, somos deslumbrados, no final de um escuro corredor, por duas salas de projecção de vídeo com seis telas, seis projectores, seis câmaras, mostram doze edifícios a cada 40 minutos. As câmaras estáticas, direccionadas para seis pontos de um edifício, registam em simultâneo o fluxo das vivências, revelando a estrutura numa interactividade vivida nos planos projectores. A disposição da instalação está a escala com os edifícios, ou seja, respeita o espaçamento e a disposição da filmagem a uma escala 1:1. Deste modo, senti a presença dos edifícios, quer por meio das projecções, quer por meio da acústica. Mesmo não estando estes fisicamente presentes, tinha a sensação de lá estar, como que vivendo a envolvente que se desenrolava neles. Havendo duas salas de projecção, em cada uma delas, estavam apresentados dois edifícios em simultâneo dando-nos, à vez, a possibilidade de visionamento das seguintes obras: o abrigo para as ruínas Romanas de Chur, o Atelier de Zumthor, a Capela Sogn Benedetg, as Habitações para idosos em Chur, a Casa Truog, o Conjunto Residencial Spittelhof, as Termas de Vals, o Kunsthaus Bregenz, a Casa Luzi, a Casa Zumthor, a Capela Bruder Klaus e o museu Kolumba.
O terceiro e último momento, corresponde a amostra de esquiços, plantas e maquetas. Os trabalhos estavam expostos perpendicularmente em relação à longitude da sala em 3 grandes bancadas. Nesta sala podíamos ver por esta ordem os seguintes projectos: o Atelier Zumthor, o abrigo das ruínas Romanas de Chur, a Capela Sogn Benedetg, as Habitações para Idosos de Chur, a Casa Truog, o Conjunto Residencial Spittelhof, as Termas de Vals, a Igreja do Coração de Jesus, o Kunsthaus Bregenz, a Paisagem Poética, a Swiss Sound Box, a Casa Luzi, o Hotel Tschlin, a Topografia do Terror, a Galeria de Arte Hinter dem Giesshaus, o Conjunto Habitacional Harjunkulma, a Adega Pingus, a Casa Zumthor, a Capela Bruder Klaus, o Museu Kolumba, a Pensão Briol, o Hotel das Termas de Vals, a I Ching Gallery, a Casa Annalisa Zumthor, o Empreendimento Habitacional de Gϋterareal, a Revitalização de De Meelfabriek, o Restaurante de Verão na Ilha de Ufnau, o Museu da Mina de Zinco em Almannajuvet, e o Memorial da Queima das Bruxas em Finnmark.
Nesta área percebe-se o método de trabalho de Zumthor. Os seus estudos baseiam-se em desenhos, maquetas e até pelo levantamento de materiais e de formas. Assim como nos seus projectos, os seus estudos, feitos por meio de maquetas, reflectem a materialização que se procura. O uso dos próprios materiais de obra, nas maquetas, dá uma riqueza da textura no objecto. Essa riqueza é inigualável, destrona as maquetas mais comerciais, que estamos acostumados de ver. É bastante visível o cuidado da materialização na maqueta das Termas de Vals. Quer o elemento físico da obra quer o elemento físico da maqueta estão sempre em consonância. Os esquiços das Termas de Vals também reflectem, de modo imediato, o ambiente que se pretende criar.
Neste piso é importante referenciar o projecto de um restaurante de Verão para a Ilha de Ufnau. O que achei particular neste projecto foi o facto de se ter feito uma pesquisa da forma e do material para cobertura por meio de objectos reais. É esse contacto com os objectos que tornam as obras de Zumthor tão “palpáveis”, ou seja, sensitivas.
Como já não poderia deixar de ser, só quero referir mais um projecto, a Capela de Bruder Klaus. É claro que os outros projectos também têm a sua importância e até podem ser muito mais interessantes mesmo assim, a minha escolha é feita devido ao método de trabalho utilizado pelo arquitecto suíço. Todos nós já sabemos como foi o método construtivo de Zumthor aquando da construção desta Capela, mas poucos viram os estudos em maqueta da mesma. As próprias maquetas sofreram o incêndio dos barrotes de madeira que dão a forma interior à capela. É notável o sentido prático deste arquitecto que não tem medo da inovação e nem de sujar as mãos. O estudo, demonstrado nesta exposição, revela a dificuldade e complexidade que tal projecto implica. Os vários estudos da disposição dos barrotes mostra que nem sempre os desenhos podem ser suficientes, sendo mesmo necessário recorrer a maquetas de estudo. E Peter Zumthor assim o fez, levando mesmo as suas maquetas ao “extremo”, queimando-as. Mas o queimar da madeira não foi apenas para se dar conta que a cofragem iria desaparecer mas sim para estudar a textura e o brilho que a madeira queimada poderia deixar nas paredes de betão. Para estudar esse efeito, estudou vários tipos de madeira assim como várias queimadas com intervalos de tempo diferentes.
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